| Anri Seki, vice-presidente executivo da Waza, diz que acordo com o Japão parece Injusto. |
Nos últimos anos, a política comercial dos Estados Unidos passou por uma transformação radical, impulsionada por uma estratégia agressiva de imposição de tarifas sobre produtos importados.
O
retorno de Donald Trump ao cenário político trouxe consigo uma onda de anúncios
de novas e elevadas taxas, inicialmente focadas na China e, rapidamente,
expandindo-se para uma vasta gama de países. O que se desenha é um novo
panorama econômico, caracterizado por um "muro" tarifário sem
precedentes na história recente do país.
Essa nova realidade, embora ainda em fase
de consolidação, já é sentida por empresas de todos os portes. O que para
alguns pode ser visto como uma medida de proteção à indústria nacional, para
muitos outros, configura-se como um verdadeiro pesadelo financeiro e
operacional.
O Cenário Atual e o Impacto Direto nas
Empresas
A partir de abril, a maioria das
mercadorias que chegam aos EUA passou a enfrentar impostos de, no mínimo, 10%.
Essa porcentagem, que já era significativa, está prestes a aumentar, com a
previsão de taxas ainda maiores a partir de 1º de agosto. Antes dessas
mudanças, a taxa média de tarifas era inferior a 2,5%, o que demonstra a
magnitude da alteração.
Para empresários como Jared Hendricks, proprietário da Village Lighting Company, sediada em Utah, o impacto foi devastador. Ele descreve a situação como um "pesadelo absoluto", tendo de recorrer a um empréstimo de US$ 1,5 milhão, garantido por sua própria casa, para cobrir o salto inesperado em seus custos. Sua empresa, que emprega cerca de doze pessoas e vende luzes e decorações de Natal majoritariamente produzidas no Sudeste Asiático, enfrenta desafios imensos. Com muitos de seus carregamentos previstos para chegar após o prazo de 1º de agosto, Hendricks luta para competir com grandes players que conseguiram antecipar suas entregas.
Grandes corporações também sentem o peso. A
General Motors, por exemplo, revelou ter pago mais de US$ 1 bilhão em tarifas
entre abril e junho, mesmo com algumas isenções para peças automotivas do
México e Canadá. A Tesla arcou com um custo adicional de US$ 300 milhões.
Fabricantes de brinquedos como Hasbro e Mattel esperam perdas de dezenas de
milhões este ano, enquanto a RTX (antiga Raytheon), do setor aeroespacial,
projeta um custo de US$ 500 milhões, mesmo após esforços de mitigação.
| Jared Hendricks, recorreu a um empretsréstimo de US$ 1,5 milhão, garantido por sua própria casa, para cobrir o salto inesperado em seus custos. |
Hendricks expressa a frustração de muitos:
"Cem bilhões de dólares em tarifas e eles estão comemorando isso? Isso
está nas costas de pessoas como eu, que agora estão tentando descobrir como
pagar a folha de pagamento."
A Perspectiva da Administração e os
Benefícios Alegados
Apesar das dificuldades enfrentadas por
muitas empresas, a administração Trump defende suas medidas, alegando
resultados "inacreditáveis". Segundo o governo, as tarifas estão
impulsionando a manufatura nos EUA, abrindo mercados estrangeiros e gerando
receita substancial para o governo. De fato, mais de US$ 100 bilhões em receita
tarifária foram arrecadados neste ano fiscal, um recorde. Além do aspecto
econômico, as tarifas também são utilizadas como alavanca em questões não
comerciais, como gastos militares e políticas de redes sociais.
Análise Econômica: Otimismo vs. Cautela
O impacto macroeconômico das tarifas é um
tema de debate entre economistas. Embora alguns setores, como o siderúrgico,
vejam as novas proteções como um impulso para a demanda doméstica, a maioria
dos especialistas prevê um crescimento mais lento nos EUA. A lógica é simples:
com a queda nos lucros, as empresas são forçadas a reduzir investimentos ou
aumentar preços, ou ambos, o que pode prejudicar as vendas e, conseqüentemente,
a economia.
A Waza, uma loja de Los Angeles que emprega cerca de 30 pessoas e vende produtos japoneses, como facas de cozinha, já elevou seus preços em 10% a 20%. Apesar de as vendas se manterem, a incerteza gerada pela política tarifária fez com que a empresa considerasse expandir para fora dos EUA. Anri Seki, vice-presidente executiva da Waza, expressa o sentimento de injustiça: "É realmente difícil para todos ver qual é o bom ponto final."
Analistas do Goldman Sachs estimaram
recentemente que as tarifas reduzirão o crescimento dos EUA em 1 ponto
percentual este ano. No entanto, as ações nos EUA atingiram novos patamares, e
o medo inicial que tomou conta dos mercados financeiros após o anúncio das
tarifas em abril diminuiu. A confiança do consumidor aumentou, os preços
permaneceram contidos e o mercado de trabalho continua robusto.
Ernie Tedeschi, diretor de economia do
Budget Lab da Universidade de Yale, projeta que as tarifas reduzirão o
crescimento em cerca de 0,8 ponto percentual este ano. Ele argumenta que há uma
"vasta distância entre 'bom' e 'recessão'", e que o cenário atual se
encaixa em um "terreno intermediário de 'não ótimo'".
Contudo, Tim Quinlan, economista sênior do
Wells Fargo, adverte que os riscos podem estar sendo subestimados. Ele observa
que os gastos do consumidor em serviços discricionários, como viagens de táxi
ou aéreas, caíram nos primeiros cinco meses do ano – um fenômeno que geralmente
ocorre durante ou imediatamente após recessões. Embora não signifique uma
recessão iminente, levanta dúvidas sobre a capacidade do consumidor de
sustentar a economia.
O Futuro Imediato e os Desafios
Contínuos
Com os estoques de mercadorias Pré-tarifas
diminuindo e a data de 1º de agosto se aproximando, os efeitos completos das
medidas serão sentidos nos próximos meses. Julie Robbins, CEO da Earthquaker
Devices, uma fabricante de pedais de guitarra sediada em Ohio, prevê que a
situação voltará a ser tão desafiadora quanto antes. Sua empresa, que emprega
cerca de 34 pessoas, já adiou contratações e compras este ano devido à erosão
dos lucros e ao aumento dos custos. Eles planejam aumentar os preços, mas a
incerteza persiste.
Além disso, as vendas fora dos EUA – que
representam cerca de 40% do negócio da Earthquaker Devices – já caíram, algo
que Robbins atribui, em parte, à reação negativa contra os americanos,
possivelmente relacionada às tarifas. "Vejo as tarifas e a atual política
de guerra comercial como a maior ameaça ao nosso negócio", afirma ela.
"Há tantas maneiras pelas quais isso pode dar errado."
Um Cenário de Incertezas e Adaptação
Constante
A política tarifária dos EUA, embora
defendida por seus proponentes como um motor de crescimento e proteção,
apresenta um cenário complexo e multifacetado. Enquanto alguns setores podem se
beneficiar, a vasta maioria das empresas, especialmente as pequenas e médias,
enfrenta custos crescentes e uma incerteza que dificulta o planejamento e a
expansão. O consumidor, por sua vez, pode começar a sentir o impacto no bolso,
com o aumento dos preços.
A redefinição do comércio global por meio
desses "muros invisíveis" exige uma adaptação constante por parte das
empresas e uma análise cuidadosa dos impactos a longo prazo. O "bom ponto
final" que Anri Seki busca ainda parece distante, e a economia global
continua a navegar por águas turbulentas, onde a resiliência e a capacidade de
inovação serão cruciais para a sobrevivência e o sucesso.
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Fonte: BBC News
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